eis aqui o texto do escritor e professor Juremir Machado da Silva que tem uma coluna diária no jornal Correio do Povo.
Diário da quarentena (5): rotina
Em tempos de
guerra ao inimigo invisível
25/03/2020 | 8:18
O presidente Jair
Bolsonaro falou em rede nacional.
A Orquestra Nacional das Panelas acompanhou todo o
seu discurso.
Ele fez bravata: disse que se contraísse o vírus,
seria, por seu "histórico de atleta", "uma gripezinha, um
resfriadinho".
Capitão, por que não te calas?
*
Os sapatos ficam na porta. As roupas vão direto
para a máquina de lavar quando chegamos da rua. Não há futebol na televisão. A
novela vista para não pensar por uma hora a cada noite será interrompida.
Frascos de álcool gel estão por toda parte. Lavamos as mãos cada vez que
tocamos em objetos ou superfícies externas. Abandonei o transporte público
quando ainda tenho de me deslocar. Sentimos medo de sair de casa. A peste tem
essa especificidade: transforma todos em ameaças e condena cada um à solidão.
Tentamos manter a calma. A tensão sobe.
Primeiro
era um caso distante, um homem infectado pela mutação de um vírus na China.
Depois, era uma cidade isolada. Em seguida, uma epidemia. Agora, uma pandemia.
No Rio de Janeiro, a primeira vítima foi uma empregada doméstica que pegou o
vírus da patroa. Uma badalada e linda estação de esqui austríaca está sendo
acusada de ter espalhado o coronavírus na Europa. Islandeses deram o alerta.
Não foram ouvidos.
Muito tempo se perdeu
minimizando o perigo até que os nomes desconhecidos foram substituídos pelos de
celebridades e autoridades infectadas. O presidente brasileiro brincou com a
vida alheia mesmo depois que o vírus tinha entrado no Planalto. Deu-se um
salto. Aparecem nomes de conhecidos entre os doentes. O medo de cada um de nós
agora é o de ser atingido ou de ver familiares e amigos infectados. As cidades
do interior não estão a salvo. Um primeiro caso foi confirmado em Santana do
Livramento, minha terra natal. Um amigo francês conseguiu embarcar para casa
pouco antes do cancelamento dos voos internacionais. Fico imaginando a sua
sensação de alívio ao encontrar mulher e filho.
Dou aula por
aplicativos. Gravo vídeos. Escrevo. Leio. Trabalho. Nem assim reduzo realmente
a angústia. Conversamos sobre como dividir o apartamento caso um de nós fique
doente. Como enfrentar o medo sozinho num quarto? A única maneira de saber se
alguém tem o vírus é testar, mas não há testes para todos. Aliás, há muito
poucos testes disponíveis. Pergunto incansavelmente a especialistas: não tem
como criar um esforço nacional para produção massiva de testes nem que o
governo tenha de interferir em laboratórios? Ouço que é impossível. Procuro
notícias sobre testagem de remédios e produção de uma vacina. Só a ciência
poderá abrir caminho para o futuro. Precisa ser rápida.
Fomos a uma farmácia
às seis horas da manhã tentar a proteção contra o influenza. Ruas mais vazias
do que de costume mesmo para o horário. Não havia mais vacinas. Na volta, um
homem começou a tossir insistentemente atrás de nós. Apertamos o passo. Ele nos
seguiu. Era uma brincadeira de péssimo gosto. Sintoma da marca deste mal:
ninguém mais é confiável. O medo instala-se e dissemina-se até irracionalmente.
Confesso que me emocionei depois de ler dezenas de textos sobre a expansão da
pandemia. Sei que o momento exige moderação e manifestações de esperança. Mas
chamei Cláudia para perto de mim e falei:
– Se eu morrer de coronavírus, não
esquece que te amei demais.
Inspire-se nas palavras do escritor e escreva o seu texto diário contando como estão sendo seus dias de quarentena.
Num caderno, faça seu DIÁRIO DA QUARENTENA. Ponha a data e escreva todo dia, relatando sua rotina no confinamento.
Abraços da professora Elisete, 02/04/20, às 22h26min
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