terça-feira, 3 de novembro de 2015

Preto e Branco, Fernando Sabino


Leia o texto.

PRETO E BRANCO”, de Fernando Sabino

Perdera emprego, chegara a passar fome, sem que ninguém soubesse: por constrangimento afastara-se da roda boêmia que antes costumava frequentar - escritores, jornalistas, um sambista de cor que vinha a ser seu mais velho companheiro de noitadas.
De repente, a salvação lhe apareceu na forma de um americano, que lhe oferecia emprego numa agência. Agarrou-se com unhas e dentes à oportunidade, vale dizer, ao americano, para garantir na sua nova função uma relativa estabilidade. 
E um belo dia vai seguindo com o chefe pela Rua México, já distraídos de seus passados tropeços, mas, tropeçando obstinadamente no inglês com quem se entendiam - quando vê do outro lado da rua um preto agitar a mão para ele. 
Era o sambista seu amigo.
Ocorreu-lhe desde logo que ao americano poderia parecer estranha tal amizade, e mais tarde: incompatível com a ética ianque a ser mantida nas funções que passara a exercer. Lembrou-se num átimo que o americano em geral tem uma coisa muito séria chamada preconceito racial e seu critério de julgamento da capacidade funcional dos subordinados talvez se deixasse influir por essa odiosa deformação. Por via das dúvidas, correspondeu ao cumprimento de seu amigo da maneira mais discreta que lhe foi possível, mas viu em pânico que ele atravessa a rua e vinha em sua direção, sorriso aberto e braços prontos para um abraço.
Pensou rapidamente em se esquivar - não dava tempo: o americano também se detivera, vendo o preto aproximar-se. Era seu amigo, velho companheiro, um bom sujeito, dos melhores mesmo que já conhecera – acaso jamais chegara sequer a se lembrar de que se tratava de um preto? Agora, com o gringo ali ao seu lado, todo branco e sardento, é que percebia pela primeira vez: não podia ser mais preto. Sendo assim, tivesse paciência: mais tarde lhe explicava tudo, haveria de compreender. Passar fome era muito bonito nos romances de Knut Hamsun, lidos depois do jantar, e sem credores à porta. Não teve mais dúvidas: virou a cara quando o outro se aproximou e fingiu que não o via, que não era com ele.
E não era mesmo com ele.

Porque antes de cumprimentá-lo, talvez ainda sem tê-lo visto, o sambista abriu os braços para acolher o americano - também seu amigo.



Responda as questões abaixo com respostas completas e claras:

1- Por que o personagem afastou-se dos amigos?  
2- Por que para o personagem, o americano poderia estranhar a amizade entre ele e o sambista? 
3- Qual a reação do personagem frente ao cumprimento do amigo? 
4- Por que o personagem entrou em pânico? 
5- Por que o personagem achou seu amigo mais preto? 
6-Você acredita que exista preconceito racial no Brasil?Já vivenciou alguma situação parecida? 
7- O desfecho da narrativa é inesperado. Se soubesse desse desfecho, o personagem teria tomado a atitude que tomou?
8-  Sem alterar o sentido da oração em que se encontra, a palavra “átimo” (l....) pode ser substituída, por
A) intuito. C) instante. B) instinto. D) intento



Produção de texto

A Declaração Universal dos Direitos Humanos proclama que "todos nascemos livres e iguais em direitos e dignidade e que sendo dotados de consciência e razão devemos agir de forma fraterna em relação aos outros." Por sua vez, consagrando os princípios de igu aldade, liberdade e fraternidade, a Constituição da República Federativa do Brasil assevera que “todos somos iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo -se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. No entanto, apesar de toda a legislação, o preconceito e a discriminação persistem e ferem, de forma aviltante e injusta, uma boa parcela da população. Dentre tantas formas de discriminação e preconceito, permanece ainda aquela de cunho étnico ou racial, ou seja, aquela baseada em características físicas ou supostamente herdadas. Há lugares no mundo em que o preconceito racial é escancarado sem nenhum pudor, em outros, como no caso do Brasil, ele é dissimulado, sutil, quase imperceptível, o que mascara as práticas discriminatórias e aponta para a ilusão da democracia racial. Considerando o texto de Fernando Sabino, (Texto 1), e as considerações acima, redija um texto opinativo a respeito do seguinte tema: O “jeitinho” brasileiro de disfarçar o preconceito racial.

Bom trabalho!
 Profª Elisete

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